quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Princípio "In dubio pro misero/in dubio pro operario" no Processo do Trabalho

O princípio in dubio pro misero, consoante Leite (2006, p. 488), consiste na possibilidade de o juiz, em caso de dúvida razoável, interpretar a prova em benefício do empregado, geralmente autor da ação trabalhista. Afinal, o caráter instrumental do processo não se confunde com sua forma.

Situações existem em que o juiz se depara com a chamada prova dividida, ou “empatada”, que não possibilita o julgador saber qual versão está realmente verossímil. (SCHIAVI, 2011, p. 81)

Sobre o assunto, Schiavi (2011, p. 81) afirma que, quando a norma propiciar vários sentidos de interpretações possíveis, deve-se prestigiar a interpretação mais favorável ao empregado. Segundo a doutrina dominante, esse critério não se aplica no terreno processual, devendo o juiz, em caso de dúvida, julgar contra o litigante que detinha o ônus probatório. A doutrina alinha outros princípios fundamentais do Direito do Trabalho, como os princípios da primazia da realidade, da continuidade da relação de emprego, da irrenuncialidade de direitos, da irredutibilidade de salários, da boa-fé, da razoabilidade, da dignidade da pessoa humana, da justiça social e da equidade.

Neste sentido, o princípio "in dubio pro misero" consiste em favorecer o autor, nos casos em que existirem dúvidas sobre determinado ponto do processo. Não obstante, a doutrina se posiciona no sentido de não ser cabível a aplicação de tal princípio no direito processual do trabalho, mas apenas no direito material, devendo naquele caso serem aplicados os princípios fundamentais do direito do trabalho.

Sabiamente, Schiavi (2011, p.82) elenca, segundo a melhor doutrina, critérios que nortearão o juiz na situação de dúvida sobre a valoração da prova ou diante da chamada prova dividida: a) a aplicação do princípio "in dubio pro operario" ao processo do trabalho; b) imopssibilidade de aplicação do princípio "in dubio pro operario" ao processo do trabalho, devendo o juiz decidir contra quem detinha o ônus da prova; c) aplicação pura e simples do Princípio da Persuasão Racional (art. 131 do CPC).

No entendimento de Schiavi (2011, p. 82) o critério para valoração da prova deve ser discricionariamente avaliado pelo juiz, não podendo a doutrina ou a jurisprudência tarifar um critério para o juiz se nortear quando estiver em dúvida. A própria existência da dúvida já se torna um elemento de valoração da prova, que é pessoal do juiz. Por isso, mesmo em caso de dúvida, deve o juiz aplicar o critério de valoração que entenda ser correto, segundo as circunstâncias do caso concreto.

Em continuidade ao seu posicionamento, Schiavi (2011, p. 83) dispõe que: 


Não obstante, em caso de dúvida, o Juiz do Trabalho deve procurar a melhor prova, inclusive se baseando pelas regras de experiência do que ordinariamente acontece, intuição, indícios e presunções. Somente se esgotados todos os meios de se avaliar qual foi a melhor prova, aí sim poderá optar pelo critério de aplicabilidade ou não do princípio in dubio pro operariocomo razão de decidir.

Ao decidir sobre a valoração da prova, baseando-se apenas no princípio in dubio pro misero, o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, se posicionou da seguinte forma: 

IN DUBIO PRO MISERO. PROCESSO DO TRABALHO. INAPLICABILIDADE PELO JUIZ.Não se aplica o princípio in dúbio pro misero no processo do trabalho. O juiz, como ser imparcial que é, deve aplicar as regras que regem o ônus da prova no âmbito do processo do trabalho (art. 818, CLT c/c art. 333, CPC), não podendo pender para o trabalhador sempre que este deixe de provar o direito alegado.818CLT333CPC
(278006020035050025 BA 0027800-60.2003.5.05.0025, Relator: VÂNIA CHAVES, 1ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 16/12/2006)

Seguindo este entendimento, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, se manifestou no mesmo sentido: 

TRT-PR-04-03-2011 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO AO EMPREGADO. APLICAÇÃO RESTRITA AO DIREITO MATERIAL DO TRABALHO - O princípio da proteção ao empregado ("in dubio pro operario" - "in dubio pro misero") rege o Direito Material do Trabalho. O Processo do Trabalho, a despeito de sua simplicidade, não se pauta pelo princípio da proteção ao hipossuficiente, mas segundo os princípios relativos à teoria geral da prova, em respeito ao princípio da paridade de armas ("Igualdade das Partes"). Assim, as lides devem ser solucionadas segundo o ônus da prova, tal como feito na r. sentença. Ainda, não acolhido o vínculo de emprego alegado, indevida a aplicação do princípio da continuidade da relação de emprego. Cumpre destacar que não se verifica qualquer violação ao princípio da boa-fé e lealdade processual na presente hipótese. Recurso do autor ao qual se nega provimento.
(22672009245906 PR 2267-2009-245-9-0-6, Relator: EDMILSON ANTONIO DE LIMA, 1A. TURMA, Data de Publicação: 04/03/2011)

Depreende-se que o princípio "in dubio pro misero" serve como meio a garantir ao empregado, parte hipossuficiente da lide, a garantia do seu direito nos casos em que existirem dúvidas sobre o convencimento do julgador, bem como nas hipóteses de conflitos entre normas, ocasião em que também se decidirá em benefício do empregado. Não obstante, ao remeter-se ao direito processual do trabalho, nota-se que a grande maioria dos doutrinadores e mormente os tribunais teem decidido que não é cabível na norma processual a aplicação do in dubio pro misero, devendo o juiz se basear nas normas de direito processual cível, aplicado subsidiariamente ao processo do trabalho, e invocar a distribuição do ônus da prova e formar seu convencimento com base nos princípios que fundamentam o direito processual do trabalho. 




Bibliografia:

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho.4 ed. São Paulo: Ltr, 2006.
SCHIAVI, Mauro. Provas no Processo do Trabalho. 2 ed. São Paulo: LTr, 2011.

2 comentários:

  1. O texto está confuso porque a autora junta ementas de julgados negando aplicação ao direito processual do trabalho do (sub)princípio "in dubio pro misero", mas ao final afirma que ele serve "como meio a garantir ao empregado, parte hipossuficiente na lide, a garantia do seu direito nos casos em que existirem dúvidas sobre o convencimento do julgador", o que contradiz, data venia, a exemplificação jurisprudencial colacionada ao texto.

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